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“Toda grande caminhada começa com um simples passo.”

Atualizado: 3 de jun. de 2023


Em nosso primeiro post para o blog do Cantinho dos Anciãos escolhemos a frase “Toda grande caminhada começa com um simples passo”, pois representa nesse momento e continuará representando ao longo da nossa jornada, o compromisso de compartilhar e construir com todas as pessoas os ensinamentos dos Mestres Anciãos através do estudo, do diálogo e das experiências, tanto pelas teorias, quanto pelas práticas, em nosso dia-a-dia. Cada projeto em nossas vidas, seja ele pequeno ou grande, necessita do seu primeiro passo. Algumas vezes ele pode se revelar como o passo mais importante em uma jornada e por isso é preciso agradecê-lo desde o seu início em respeito as pessoas envolvidas direta e indiretamente, bem como a oportunidade em si que nos foi dada desde o começo do percurso. Assim, agradecemos dizendo:


Gratidão as pessoas, ao universo e aos Mestres Anciãos

pela oportunidade do projeto Cantinho dos Anciãos!

Gratidão a Grande Luz por tudo!







Tendo feito os agradecimentos vamos para a nossa questão central do texto. A frase no título deste post é uma adaptação e uma inspiração moderna difundida e compartilhada na internet e nas redes sociais e que tem por fundamento os ensinamentos de Lao Tzu (Lao Tze, Lao Zi, ou ainda Laozi - 604-475 a.c.), conhecido em seu tempo pelos títulos de “O velho mestre” ou “Venerável filósofo”. O seu livro Tao Te Ching (道德經), o Livro do Caminho e da Virtude[1] é a base da filosofia do Taoísmo. No Tao Te Ching, mais especificamente no aforismo 64, da linha 11 a 12 encontra-se o texto da frase original:


“Uma jornada de mil li[2] começa a partir de um passo.”


Adicionamos abaixo, também, o trecho completo da linha 7 a 12, do mesmo aforismo 64, para uma melhor contextualização dos ensinamentos acompanhado da escrita original em chinês[3]:


合抱之木,

hé bào zhī mù,

Uma árvore de grande abraço

生於毫末。

shēng yú háo mò.

nasce a partir da mínima poeira.

九層之臺,

jiǔ céng zhī tái,

Um pagode de nove andares

起於累土。

qǐ yú lěi tǔ.

ergue-se a partir do acúmulo de terra.

千里之行,

qiān lǐ zhī xíng,

Uma jornada de mil li

始於足下。

shǐ yú zú xià.

começa a partir de um passo.[4]

A frase original, “a jornada de mil li começa com um único passo realiza como em todos os aforismos do mestre Lao Tzu o ensinamento do Tao (Dao) que apresenta e revela as dualidades do caminho/realidade. O Tao poderia ser traduzido por ‘caminho’, mas seria reduzir muito a sua real dimensão, pois o Tao compreende ‘caminho’ em um sentido lato, isto é, de grande amplitude, como por exemplo o caminho das várias vidas que já vivemos. Compreender as dualidades da vida humana passa pelo viver, conhecer e ser consciente do fluxo cósmico (Tao) e concomitantemente com o equilíbrio do yin e do yang.


Do Desequilíbrio a Harmonia


Vamos de encontro ao fluxo cósmico quando desejamos que nossos pensamentos e ideias políticas, filosóficas, sociais, econômicas, dentre muitas outras, alcancem as outras pessoas por imposição do pensar e do agir interferindo no livre arbítrio da convivência; ou quando julgamos e rotulamos outras pessoas em nossos pensamentos ou em nossos círculos sociais de convivência; ou ainda quando agimos criando por meio de comentários inoportunos e até difamatórios, as popularmente conhecidas fofocas, a interferência no fluxo dos acontecimentos e no equilíbrio das relações de convivência e até no estado de equilíbrio íntimo das pessoas envolvidas. Consequentemente estamos promovendo um desequilíbrio do Tao, isto é, do caminho natural. Em tais ações interferimos no fluxo gerando desarmonia.


Segundo o taoísmo, o Tao (fluxo cósmico) é o grande princípio oculto que orienta o universo. Este grande princípio é revelado pelo pensamento filosófico Wu Wei[5] que advém dos ensinamentos presentes no Tao Te Ching como um princípio prático compreendido como não ação (无为). O Wu Wei, não significa fazer nada, muito pelo contrário, significa não agir artificialmente. Para tanto é necessária uma postura de compreensão maior sobre a natureza essencial do meio de convivência e realidade.


Essa postura de compreensão passa por níveis que se iniciam no estágio do respeito desenvolvido pela prática e não apenas pelo pensamento, e segue em novos níveis individuais e coletivos até alcançar a harmonia do mundo. O primeiro passo pode ser ou não o mais difícil para alguns, contudo pequenas atitudes de respeito, de inclusão, de tolerância, de empatia e de bondade são exemplos na prática de como se ergue pilares morais sólidos nas relações de convivência.


Na medida em que os pilares morais são erguidos tornam as pessoas mais flexíveis e resistentes diante das atribulações.


Na cultura oriental o simbolismo do bambu expressa bem o sentido desse pensamento através dos provérbios chineses:



O bambu aparenta ser frágil e fraco à primeira vista, pois parece que vai quebrar ao meio mesmo com as menores intempéries da vida. Contudo, ao contrário das árvores frondosas com suas grandes copas e de aparência forte, o bambu se curva ao vento e a neve e não quebra. Ele não age contra o vento e a neve, mas se move junto ao vento e a neve, mesmo diante de uma tempestade violenta o bambu se recupera.



Na vida, no dia a dia, as dificuldades podem alcançar níveis de ansiedade, de angústia, de sofrimentos e dores que parecem impossíveis de se lidar num primeiro momento, e as vezes nem mesmo num segundo momento. Nessas circunstâncias como em todas as outras para solucionar os problemas e encontrar ou manter um estado de equilíbrio é necessário ser humilde para se dobrar e compreender o peso das responsabilidades e dificuldades, não apenas baixando a cabeça e se tornando subserviente; é necessário ser flexível para aceitar as mudanças que a vida proporciona e se adaptar ao processo em que os acontecimentos se desenvolvem; ser resiliente para entender que o vento e a tempestade passam e se tornam uma brisa, e a neve derrete com a chega da primavera.


Logo, não ação é um princípio que busca constantemente a reconquista do estado de harmonia perfeita. Se entendermos bem a natureza das coisas ao nosso redor e extrairmos desse conhecimento a consciência necessária para o pensar e o agir que nos aproximam enquanto humanidade vamos enxergar todo o potencial desse conhecimento a partir da nossa própria natureza interior. Como nos ensinamentos de Lao Tzu, no aforismo 76, quando demostra por meio do elemento água o mesmo princípio do ensinamento do bambu, dizendo:



Os grandes ensinamentos podem ser encontrados ao nosso redor o tempo todo como demonstram os mestres. Seja, portanto, brando e não rígido, seja suave e não duro em seus pensamentos e ações para a cada dia compreender que cada postura e posicionamento da mente e do corpo estejam de acordo com o que há de mais puro no mundo e em sua alma. A cada momento que exercitamos e vivenciamos essa compreensão nos libertamos do peso das artificialidades e ilusões do mundo.



Seja humilde e flexível como o bambu!

Seja brando e suave como a água!



Compartilhe conosco se gostou do texto e deixe os seus comentários sobre algum tema que você gostaria que abordássemos no Cantinho dos Anciãos.

Se possível compartilhe o nosso Cantinho dos Anciãos e suas redes sociais.


Amor e Luz do Cantinho dos Anciãos,

Ruan Fernandes



Notas: [1] A tradução adotada para o artigo do post foi feita e registrada na Biblioteca Nacional pelo tradutor Fāng Chén, do Chinês Antigo para o português, com revisão e sugestões de Jozias Martini, ambos do Projeto Luz do Oriente. [2] Uma das unidades de medida válidas na China Imperial. Um li tem uma equivalência de 6⅔ metros de Si (Sistema Internacional de medidas). Assim, Mil li equivale a 644,65 metros. [3] Chinês é o conjunto de dialetos falados na China, no qual se inclui, também, o mandarim, que é o idioma oficial do país.

[4] Alternativa de tradução: “A árvore que enche os braços cresceu do menor broto; a torre de nove andares ergueu-se de um (pequeno) monte de terra; a jornada de mil li começou com um único passo.”

[5] Wu o termo pode ser traduzido, a princípio por: “não”. Mas, também, pode ser compreendido por “vazio” ou “não existência”, e ainda por “nunca”; “sem”; ou “nada”. A tradução do termo Wei pode ser: “fazer” ou “agir”; ou ainda “servir como” e/ou “governar”.


Bibliografia:

BOREL, Henri. Wu Wei: A Sabedoria do Não Agir. São Paulo, Attar, 2015.

FISCHER, Theo. Wu Wei: A Arte de Viver o Tao. São Paulo, Terra, 2019.

LAO TZU. Livro do Caminho e da Virtude. Tradução de Fāng Chén. Projeto Luz do Oriente: 2019. p.604.

SCHWANFELDER, Werner. Lao Tse: O Segredo Do Tao - O Caminho Natural. Petrópolis, Vozes, 2009.

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